terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Carros e nacionalidades - parte 1

Houve um tempo em que parecia ter certa lógica gostar de um automóvel segundo seu local de produção. Diversos fatores culturais e industriais faziam com que o produto final, absorvesse grande quantidade de vernáculos e assim se delineava um caráter que dificilmente se repetiria dentro de uma mesma nação, menos ainda fora dela.
Concomitante a isso, desde a aurora da indústria automobilística, sempre houve o diálogo entre o poder público e o industrial que enchergaram uma fonte de lucratividade na competição à motor, que inclusive precedeu a propaganda propriamente dita. Nesse caso, pintar o veículo com uma cor que representaria uma nação, foi um passo quase que natural, assim estaria estabelecido o primeiro elo de comunicação entre os fabricantes e os espectadores das competições.

Logo na primeira década do século XX, as competições automotivas envolveram 3 países europeus: Itália, Alemanha e França que escolheram respectivamente as cores vermelho, branco e azul para representar seus carros. Nessa época a Inglaterra que era um dos países mais motorizados, havia  elaborado um conjunto de regras e leis para tentar diminuir acidentes que foram comuns à sociedades totalmente inexperientes com a presença daquele "objeto novo" trafegando pelas ruas da maneira que seu condutor bem entendesse. Uma delas foi a proibição das competições (por ironia, já que algum tempo depois se tornou o berço do automobilismo mundial). Forças contrárias queriam seu país imerso àquela nova modalidade de esporte, para tanto utilizou de um artifício, levou as corridas para a vizinha Irlanda que não estava sob o mesmo crivo. Como forma de homenagem, deu aos carros a cor verde daquele país, mais tarde escureceu-o e redenominou-o como British Racing Green.
O filme exibido no Ferrari World de Abu Dhabi é um excelente exemplo, denominado Cinema Maranello, reinterpreta uma das primeiras vitórias de Enzo Ferrari, correndo pela Alfa Romeo na década de 1920. Nessa recriação temos essa questão da cor ligada a nação de maneira latente.


Um episódio bastante interessante foi o do GP da Alemanha de 1934, a mercedes W25 havia excedido os 750kg de peso regulamentar, sem tempo para quaisquer modificações Alfred Neubauer (diretor esportivo da marca), teve a inusitada idéia de lixar o veículo retirando todas as camadas de tinta, deixando exposto o alumínio da carroceria, nasciam aí as "Flechas de Prata".

O Automobile Club de France que era o órgão regulamentador das competições e que anos mais tarde viria a se tornar a FIA (Fédération Internationale de l´Automobile), criou uma cartilha que contemplava todo o esquema de cores dos veículos que competissem em provas internacionais, para mais de 50 nações. Dentre outras coisas se estipulava a cor do corpo principal do automóvel, cor do capô do motor, cor das rodas, faixas e listras, cor e fundo das numerações. Tal prática começou a mesclar-se com o advento do patrocínio de grandes marcas nos automóveis na década de 60, mesmo assim vigorou formalmente até meados dos anos 70.

Além dos países citados, vale lembrar outros episódios interessantes, os EUA inicialmente corriam de vermelho e chegaram a "negociar" esta cor com a Itália, que em provas onde os 2 países se encontraram correu de preto. Após diversas derrotas, atribuiu "má sorte" à coloração e assumiu a cor branca que ficara vaga após a Alemanha tê-la trocado pela prata. Com o pós guerra, incorporou faixas azuis longitudinais, principalmente para diferenciar-se do Japão que utilizava o branco com o círculo vermelho da bandeira. Ocasionalmente inverteu a ordem utilizando o azul como fundo e listras brancas.

Em 1948 ao retomar sua atividade desportiva, Enzo Ferrari tentara incorporar sua cor oficial, o amarelo, oriundo do escudo do Cavallino Rampante, negociando com a Bélgica que ostentava a cor em seus carros. Diálogo infrutífero, no final acabou assumindo o rosso corsa italiano.
Juan Manuel Fangio, conseguiu imprimir as cores de seu país, azul claro com capô amarelo, ao carro italiano que pilotava, a Maserati de 1949, numa rara demonstração de "quebra de regras" nesse sentido.
Enquanto países como Portugal e Espanha diferenciavam seus carros pintando o capô de verde e amarelo respectivamente, distinguindo-os assim dos italianos, outras nações jamais precisariam se preocupar como por exemplo a Holanda e seu inconfundível laranja.
Não tão presentes nesses primórdios, carros brasileiros ficaram famosos nas décadas de 1950 e 60, utilizando seu uniforme em pale yellow com listras verdes longitudinais e rodas da mesma cor.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Ilha de Man - Dias de glória no presente


Colonizada pelos Vikings, a ilha de Man foi finalmente anexada à Inglaterra no século XIV, um século depois passou para o controle e subordinação da Coroa Britânica (leia-se família real) e assim permanece até hoje.
Assim como Jersey e Guernsey, a ilha não faz parte do Reino Unido e tão pouco da União Européia, manobra com a qual os ingleses conseguem "justificar" o amplo incentivo fiscal para que instituições financeiras se estabeleçam nesses locais atraindo investidores e formulando juntamente com o turismo a principal fonte de renda, mesmo porque já vão longe os anos onde pesca, lã e agricultura faziam esse papel.

A ilha possui uma população pouco superior a 80 mil habitantes, distribuídos em uma cidade pequena chamada Douglas e dezenas de vilarejos por toda sua extensão. As estradas que fazem essas ligações, são simples e de traçado antigo, mas bem pavimentadas e conservadas.

Houve época em que as corridas em circuitos de rua e estrada eram as mais comuns, o baixo fluxo permitia um uso domenical ou sasonal no que tange a esporte à motor.
Tais circuitos ganharam fama e glamour desde a existência dos veículos motorizados que quase se confundem com a história das competições, eram extensos e acessíveis a um grande número de espectadores que querendo ou não veriam as máquinas passarem pelas janelas de suas casas; assim ia se disseminando uma cultura. O perigo sempre estava à espreita porque as vias não haviam sido projetadas para tal prática, não havendo áreas de escape e outros tipos de preparação, isso fazia com que um grande número de fatalidades ocorresse.

Muitas dessas regiões se adensaram vegetativamente e aliadas a novas exigências de segurança, esses circuitos, pouco a pouco foram se extinguindo entre as décadas de 1950 e 1970. Dentre as provas mais famosas: a Mille Miglia realizada no centro-norte italiano, a Targa Florio siciliana e a Carrera Panamericana mexicana.
Na ilha de Man, a prova que neste ano completa 106 anos oficialmente, já passou por pequenas modificações e abrangências (incluindo corridas de automóveis e parte do calendário do mundial de motovelocidade), contudo segue como maior ícone mundial das provas de estrada.
O foco das competições sempre foi a motocicleta e até os anos 1970 conseguiu atrair etapas do calendário mundial de competições e com isso os grandes pilotos da época, como o penta-deca campeão mundial Giacomo Agostini que gostava muito dessa corrida, vencendo num total de 10 vezes.

Hoje o circuito de 37,73 milhas, equivalente a 60,37 Kilômetros é percorrido em pouco mais de 17 minutos por motos das categorias 600 e 1000 cm3, a maioria dos competidores se especializaram apenas nesse tipo de prova e alguns deles conseguiram feitos notáveis no local, como as 19 vitórias de John McGuinness e as 26 de Joey Dunlop em diversas categorias.

Depois do início dos anos 70, a prova ficou restrita ao IRRC (International Road Racing Championship). Também presentes nesse campeonato estão circuitos de rua/estrada na Irlanda, Holanda, Bélgica, Alemanha, Inglaterra, República Tcheca, Nova Zelândia e Macau.
Obviamente contra os preceitos atuais de segurança no esporte motorizado, tais eventos se sustentam por razões econômicas, mesmo as mais de 200 mortes em 1 século, ocorridas apenas no Tourist Trophy de Man, não são o bastante para convencer os organizadores e participantes do evento anual. Todo mês de Maio, a atenção mundial do motociclismo se volta à pequena ilha, aonde milhares de turistas telespectadores se dirigem para assistir de perto esse que apesar dos pesares é inegavelmente o resquício mais forte do esporte motorizado em seu estado da arte, vivo no planeta.