sábado, 9 de novembro de 2013

Filmes e Automóveis

Nem sempre uma boa película com a temática automotiva tem o carro como protagonista ou como foco do enredo. Poderíamos então iniciar qualquer conversa sobre o tema, distinguindo filmes "de" automóveis ou "com" automóveis.
No entanto, acaba prevalecendo a memória referencial que possuímos, mal percebemos e já estamos misturando "alhos com bugalhos" num eventual ranqueamento. Seja como for, o que parece realmente importar é a marca cultural e histórica deixada que muitas vezes dita tendências. Alguns filmes nascem "prontos" e causam algum impacto em sua época tornando-se referência imediata, outros, desapercebidos em seu tempo, necessitam que contextos históricos ainda se desenvolvam para que num olhar futuro haja uma valorização, talvez impensada em seu lançamento. Alguns chegam a ser referência cult, trilhando essa dinâmica.
Sem muita preocupação em uma eventual classificação técnica, seguem alguns filmes que foram referência antes ou depois, influenciaram gerações ou ainda serviram de inspiração para o tema, dentro e fora do cinema.

Arte dentro da arte, assim defino o trecho inicial de Le Mans, o filme de Lee Katzin. Apesar das limitações da época (1971), do fato de ser um meio filme, meio documentário, utilizando-se da corrida propriamente como base da película, ainda não surgiu algo que chegue perto para um entusiasta automotivo. Talvez porque tenha sido estrelado e idealizado por um, Steve McQueen. A fotografia é uma aula e nos faz "viajar" até lá, sem necessidade de palavras, ritmo que aliás acompanha todo o filme.
O trecho em questão mostra o piloto Michael Delaney, retornando à capital da belíssima região de Sarthe, para mais uma edição das 24 horas. Após ter se acidentado no ano anterior, fato que ocasionou a morte de outro piloto, sua viúva, a belíssima Lisa Belgetti (a atriz Elga Andersen) que não consegue abstrair-se do mundo das competições, vive um quase impensável romance.
 
O não menos icônico Grand Prix, de John Frankeinheimer, 1966. Também prima pela fotografia impecável, cenas reais incluindo pilotos daquele campeonato anual de Fórmula 1. Na minha opinião, transporta o telespectador, através de tomadas precisas e alucinantes a realidade da competição automobilística. Pra variar, tem na trama, uma donzela disputada por dois pilotos. Em 1967 o filme arrematou nada menos que 3 Oscars.
 
O filme em si, película dirigida por Peter Yates em 1968, estrelando Steve McQueen, chega a ser monótono para os padrões atuais. No entanto a cena de perseguição envolvendo o Ford Mustnag GT 390 e o Dodge Charger R/T, são sem sombra de dúvida, o desafio automotivo mais famoso do cinema. Ganhou notoriedade após algumas décadas e virou uma espécie de filme cult. A Ford lançou versão comemorativa do Mustang, quando o filme aniversariou 40 anos em 2008, denominado também, Bullitt.
 
The Fast and Furious, título de 1955, em nada se parece com os homônimos "enlatados" dos anos 2000. Trata-se de trama onde uma pessoa procurada pela lei, tenta se camuflar em meio a corridas de finais de semana, na Califórnia dos anos 50. Deixando as limitações técnicas de lado, mostra cenas envolvendo em sua maioria, belos Jaguares XK, além de retratar hábito comum à época e sociedade, aonde gentlemen drivers se misturavam a pretensos pilotos, em corridas que envolviam veículos com set up de fábrica, história que sempre ouvimos mas não vivenciamos.
 
Ao contrário, o "Gone in 60 seconds" de 1974 é a matriz do filme conhecido na atualidade. A trama é basicamente a mesma, com uma produção infinitamente mais simples. No entanto, é interessante observar como a dinâmica, não só desse como de outros filmes da época, permitiam cenas quase infindáveis de divertidas perseguições automobilísticas, tudo sem maiores explicações ou diálogos. Um deleite para observar os veículos e maneirismos da época.
 
"The Gumball Rally" de 1976, foi inspirado nas 5 corridas realizadas no início dos anos 70, coast to coast, entre New York e Redondo Beach em Los Angeles Califórnia. O ato original: "Cannonball Run", concebido pelo escritor e piloto Brock Yates e seu amigo, editor da revista Car & Driver, Steve Smith, visava protestar contra as recentes reformulações impostas pela "Lei Nacional de Velocidade Máxima", que impunha 55mph(89 Km/h) como limite máximo nas autoestradas. A referência(irônica) do nome, remonta 1933 onde Erwin George "Cannonball" Baker, perfez o mesmo trecho em velocidade média superior.
A cada edição, novos participantes se interessavam, formando um conjunto muito heterogêneo de pessoas e carros. A vitória marcante foi sem dúvida a do piloto Dan Gurney (vencedor de Le Mans), ao lado de Yates numa Ferrari Daytona. Ao final soltou a famosa frase: -"Não passamos do limite!Nunca excedemos 175mph durante o trajeto". (equivalente a 280Km/h, velocidade "limite" da Ferrari Daytona). Décadas mais tarde, a idéia retornou em eventos milionários, nos Eua e Europa, não mais com fins de protesto.
 
 
"La Polizia Incrimina La Legge Assolve", Enzo Castellari, 1973 e "Con la Rabbia Agli Occhi", Antônio Margheriti, 1976. Falar de perseguição automobilística sem citar os filmes italianos dos anos 70, com as famosas Alfa Giulia adotadas pela Polizia e pelos Carabinieri, seria como esquecer daquilo que gerou todo um material de base que serviu de inspiração para os filmes das décadas posteriores. De certa forma, a "perseguição europeia" era bem distinta da americana, sem aquelas explosões, sem a profusão de batidas múltiplas, mas igualmente eletrizante. Cenas frenéticas em paisagens deslumbrantes, algumas em ruas estreitas, carros descendo escadarias e derrubando bancas de frutas, tornaram-se clichês.
 
O filme na linha trash "Christine, o Carro Assassino", foi uma adaptação para o cinema do romance de Stephen King de 1983. Vale pelas tomadas com carros interessantes dentre os quais, o Plymouth Fury protagonista. A cena da morte do vilão, acima, é sobretudo icônica na tomada da perseguição com o carro em chamas.
 
Como não mencionar "Herbie, The Love Bug", 1968. Início de uma série, talvez o personagem automotivo (humanizado) mais famoso da história do cinema. Apesar do enfoque infantil e caricata, mexeu com o ego de "metade" da população mundial, que em alguma parte da vida possuíra um "Besouro" semelhante.
 
"Dirty Mary Crazy Larry", 1974 com Peter Fonda. Mais um americano para alucinados por velocidade e que curtem perseguições infindáveis. Outro filme que teve sua importância pelo legado referencial em produções posteriores.
 
"Vanishing Point", 1971. Kowalski e seu Challenger nunca estiveram fora da lembrança de quem aprecia perseguição automobilística. Tornou-se ícone e gerou a menos interessante versão de 1997.
 
"American Graffiti", 1973. Coppola produzindo e Lucas dirigindo, seria à toa ser o preferido dos cinéfilos sobre o tema?
 
"The Italian Job", 1969. O título em português "Um golpe à italiana", é discutível, já que nesse sentido tratou-se de um golpe à inglesa...na Itália. Belas sequências com os Minis.
 
"Mad Max", 1979. Um clássico atemporal já que tratava a realidade de maneira deturpada em futuro próximo da humanidade. O automóvel nesse filme transforma-se em arma necessária para a sobrevivência num mundo caótico. Maior bilheteria australiana de todos os tempos, imortalizou Mel Gibson.
 
 
"Ronin" de John Frankenheimer (Grand Prix), 1998. Logo se vê que é filme dirigido por quem entende e gosta do assunto. Na categoria "car chase", o melhor de todos os tempos em minha opinião. A fotografia é muito bem explorada e as tomadas partem de câmeras sempre bem posicionadas, paradas ou nos veículos, pois quem deve dar ação à película são os carros e não tremeliques e câmeras ziguezagueando como vemos em alguns filmes modernos. Este, tentaram imitar, mas nunca chegaram nem perto.
 
 
"The Driver", 1978, com Ryan O´Neal. O filme é permeado por diversas perseguições, com belíssimas tomadas e com muita variedade de automóveis da época.
 
 
 
 Premiado em Cannes, "Drive" de 2011 é uma adaptação do romance quase homônimo que gerou o filme em 1978. Raro caso em que o que veio depois supera em todos os sentidos o filme anterior. Dirigido pelo dinamarquês Nicolas Winding Refn e estrelado por atuação impecável de Ryan Gosling. A trama, toma emprestado algumas referências do filme anterior mas cria novas situações exploradas de forma muito mais complexa. Tem um caráter de direção diferente de qualquer filme de suspense, uma fotografia magnífica (filmado em formato digital por câmeras Arri Alexa) e uma trilha sonora excepcional (resgataram a belíssima Oh My Love de Riz Ortolani, um dos temas de outro filme: Addio Zio Tom, de 1971). Extrapola a questão aqui abordada e é sem dúvida um dos grandes filmes americanos dos últimos anos (palavras da crítica). Na minha opinião, raro bom exemplar da nova geração de filmes automotivos.
 

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